segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Esse silêncio...

Então é por isso?, que se torna tão importante e inadiável abrir as palavras como braços que se abrem para apartar, para apartar o silêncio. Ser perspicaz e desesperado o suficiente para identificar o silêncio num vão de quarto ou no aberto duma praia e formar ao redor dessa inanição das palavras palavras que cubram essa ausência de coisas não ditas, palavras que lancem sombras sobre esses... esses silêncios.

Então é por isto?...
Mas que é esse isto, em nome dos deuses?...
Suposições, memórias, invenções ou poesias?

Há quem ainda diga, que por dentro de nós passam rios, ou ainda que somos, nós, rios que seguem não sei eu pronde...

Fecho os olhos e sinto minhas pernas tremer, como se submersas por água corrente elas tentam e só tentam andar. Pergunto em súplica aos deuses - se algo ainda resta deles - ou a mim mesmo ou a qualquer coisa que se me escute dentro de mim o porque do sangue que jorra de mim por cima da carne imaculada, o porque do pus sem chaga, sem corte. Minhas cicatrizes não estão todas fechadas?

E por que é?, do sangue que derramo de Outro's sem que a mão erga, ou a voz, ou... eu nem tenho voz.
Será mesmo isso?, a ausência das palavras, dos atos, de um sentar e de um deitar, será o revés de um grito que se faz curvar abatido aqueles que quero eretos e iguais diante de mim?

Fecho os olhos dentro de mim imaginando, enquanto faço caladas perguntas, onde é que a luz - seus derivados - nasce, onde dorme e onde acorda.
Onde e como e por que e para quê faiscam as coisas. Tento encontrar, num momento em que trago um sol pro pensamento, o momento exato em que a luz de uma sombra se faz caindo por detrás de uma árvore... e tento entendê-la. Tento não mais desesperado, mas simplesmente cálido, pouco impassível - que é preciso dessa serenidade pra isso - olhar de um só e único tempo a árvore e a sombra, enquanto jogo pra fora de mim e dessa paisagem, todo o vento, a mais ínfima centelha de vento; quero a árvore parada, quero sentir o movimento desse sol e observar, pois-como-preciso, vida, encontrar algo no movimento quase imperceptível da sombra sem o balanço da árvore, porque tudo isso "faço" tentando alcançar o primeiro golpe, o primeiro virar de costas, ando agachado de dentro do dentro de mim: duas vezes dentro, procurando aos tateios pela fonte de onde surgiu e ebuliu o sangue primeiro.

Saio de tão fundo e fico somente dentro de mim, com aquelas águas atravessando minha cintura, vindo não sei de que lugar, indo não sei pra que lugar, dentro de mim abro olhos e me pego consciente agora, naquele pensamento primeiro, Então é isso?, é inerente?

Mas onde nascem os silêncios?
Besteira, pode ser que seja mesmo! inerente.
Mas onde nasce?...

Tragam-me, rios, ou traga-me. Só não me deixe outro dia sem respostas.
De quantos irmãos a garganta cortei e quantos foram os corpos que afundei no Tigre ou no Eufrates: dependendo de qual estivesse a menos passos de distância? Quantos foram os rostos de iguais que afoguei no Nilo enquanto membros se debatiam como as palavras de dentro de mim se debatem chorosas precisando sair sem que na maioria das vezes eu dê por elas até se calarem esses membros e eu os reconhecer finalmente como semelhantes do meu silêncio... só até senti-lo de novo como um grito em suspenso que voltará aos ouvidos do mundo... senão nessa noite, na outra, ou na outra até atravessar as vidas?

Cobrir o silêncio pelo lado de dentro cansa em demasia...
Estirar panos sob o silêncio...

Começo a abrir os olhos antes de começar a me afogar e como quem vê, escuta e sente de relance, vejo, escuto e sinto portentos babilônicos, como uma lâmina erguida em nome de Marduk, como um rio de sangue que corre caudaloso onde deuses sanguinolentos se saciam da sede tão quimeramente herdada por nós, então volto a fechar os olhos como quem ergue a palma de uma mão pra apanhar algo, como quem mergulha pra dentro de si, pra dentro de um rio de correntes poseidônicas e com urgência vou ao fundo como quem vai a procura de um ente, de uma amada, mas não tem mais nada aqui e isso tampouco é o rio caudaloso que pensei, estou no meio do oceano, no fundo sem fundo do silêncio inextinguível do oceano.


A. do Carvalho...
...em 31 de janeiro de 2011

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